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OS QUATRO PODERES DOS MAGOS

[Retirado do livro "Enciclopédia de Bruxaria", de Doreen Valiente]



Os Quatro Poderes dos Magos são os atributos tradicionalmente necessários para a prática bem-sucedida da magia. Eles são: saber, ousar, querer e calar. Esses poderes são geralmente chamados por seus quatro nomes em latim: noscere, audere, velle e tacere.

Um pouco de reflexão sobre esse tradicional ensinamento da magia irá mostrar as razões por trás dele. Nenhum dos poderes é suficiente de maneira isolada; os quatro poderes devem estar presentes, equilibrando-se uns aos outros. O mero conhecimento não é suficiente sem a vontade ou a coragem de colocar o trabalho em prática. Nem são a vontade e a ousadia de qualquer benefício sem o conhecimento para dar-lhes apoio. A audácia não irá chegar muito longe, sem a vontade por trás dela para fazer ao fim. A força de vontade deve por sua vez reunir a coragem para dar o primeiro passo.

Tudo isso é em vão, a menos que o mago tenha a discrição de manter-se em silêncio mantendo seu próprio conselho. Nenhum tagarela ou fofoqueiro será capaz de alcançar o verdadeiro poder mágico.
Na verdade, foi dito que o quarto poder, o de permanecer calado, é o mais importante de todos, e o mais difícil de alcançar. O silêncio é uma força poderosa por si só; o silêncio do grande e eterno deserto debaixo das estrelas; o silêncio das montanhas cobertas de neve nos telhados do mundo; o silêncio dentro das catacumbas das pirâmides. Esses são os silêncios dos tesouros secretos, ordenados aos iniciados. Nenhum homem falante ou fanfarrão será capaz de possuí-los.

As pessoas que revelam seus planos e ideias para todo mundo dispersam suas próprias forças. Operações ocultas em particular não devem ser discutidas, ou elas jamais renderão frutos. É por isso que nos dias de hoje, embora a perseguição da Igreja ou do Estado tenha de forma geral cessado, todas as sociedades ocultas sérias, incluindo a Arte dos Sábios, mantém seus ensinamentos e práticas mais íntimos em segredo. Isso não acontece, como os escritores sensacionalistas supõem, por causa de orgias de veneração ao demônio em seus encontros, mas porque essa é a tradição mágica e mística. A Maçonaria também segue essa linha, e define-se como sendo não uma sociedade secreta, mas uma sociedade com segredos.

A tradição é tão antiga quanto os dias dos Cultos de Mistérios do passado, quando uma simples religião esotérica era ensinada à população em geral, enquanto um ensinamento esotérico era para ser descoberto por aqueles que desejassem buscar respostas mais além e que tivessem capacidade para compreende-las. (...)

Há uma correspondência entre os Quatro Poderes do Mago e os Quatro Elementos. Noscere, conhecer, corresponde ao Ar. Audere, ousar, corresponde à água. Velle, querer, corresponde ao fogo. Tacere, calar, corresponde à terra.

O Ar é o elemento de Mercúrio, o rei do conhecimento. A água traz consigo a ideia de lançar-se com ousadia sobre as ondas de mares desconhecidos. O fogo faz-nos lembrar da chama do desejo. A terra transmite-nos o silêncio das rochas e montanhas. Quando todos esses quatro elementos são reunidos, temos a aparição do quinto elemento, o espírito, e sua correspondência é o quinto poder: ire, ir, o poder de progressão através do universo, o poder da evolução.

Pelo fato de a esfinge ser uma representação dos Quatro Elementos, esses poderes são às vezes também chamados de Os Quatro Poderes da Esfinge.

DIFERENÇAS ENTRE A BRUXARIA E A MAGIA CERIMONIAL

[Retirado do livro "Enciclopédia de Bruxaria", de Doreen Valiente]



A magia dos grimórios, como a Chave de Salomão, o Lemegeton, o Sexto e o Sétimo Livro de Moisés, etc., é algo inteiramente diferente das antigas tradições pagãs da bruxaria. A magia cerimonial é a magia dos homens cultos, e até mesmo dos sacerdotes. Ela tem um toque religioso muito forte, tanto do Cristianismo como do Judaísmo, e em sua maior parte deriva da Cabala Hebraica que recebeu uma unção cristã.


Seu método de trabalho é o de controlar os poderes da natureza, que são concebidos como angelicais ou demoníacos pelos poderosos Nomes Divinos que formam as palavras de conjuração. Essas palavras, por exemplo, como Agla, Adonai, Tetragrammaton, Sabaoth, Anaphaxeton, Primeumaton, Sother, Anthatos, palavras que são uma mistura do hebraico e do grego, e são todos nomes de Deus.


Suas instruções são geralmente complicadas e exigentes, e requerem que o mago se purifique por meio do jejum, banhando-se, e vestindo-se com túnicas limpas e consagradas antes de entrar no círculo mágico. Ela usa pentáculos e ferramentas consagradas, assim como a bruxa, porém, tudo com um aspecto mais elaborado. Ele reza por longos períodos de tempo, nas formas do Judaísmo ou do Cristianismo, pedindo poder para realizar sua operação mágica, fazendo com que os espíritos do céu ou do inferno façam sua oferta.

O método de procedimento das bruxas é mais simples e mais direto. Na verdade, as pessoas que praticavam a bruxaria podiam ser e frequentemente eram analfabetas, ao passo que os magos cerimoniais tinham que ser mais ou menos um "clérigo estudado".

Suas artes foram oficialmente proibidas pela Igreja, mas não, na prática, com tanta severidade quanto as das bruxas, porque a bruxa era uma herege pagã, enquanto o mago cerimonial, até mesmo quando começava a invocar demônios, era considerado dentro das leis da Igreja.

Ele de forma indigna negava que era um satanista ou um reverenciador do demônio. Na verdade, o alegado culto do Satanismo é, opinião da escritora, algo de origem consideravelmente moderna, principalmente literária.

As origens e as práticas das bruxas vêm do raiar do mundo. Ela observa festivais pagãos e invoca deuses pagãos e, mesmo que exista muito solo comum entre a bruxaria e a magia cerimonial, essa é em si sua maior e mais substancial diferença.

O Círculo Mágico da Velha Bruxaria

Velha Bruxaria, certo? Não é a Moderna.
Ok, let's go!


Círculo mágico de pedra – ruínas de Stonehenge

Ao nos aproximarmos de um velho círculo mágico, a primeira coisa que nos chama a atenção é algo semelhante a uma trave de futebol, a nordeste do círculo.

Essa "trave" é um trilithon, feito de três estacas bifurcadas, de carvalho, freixo e espinheiro ("oak, ash and thorn", tb chamados a Tríade das Fadas). A estaca de freixo representa a Deusa, e está colocada perto do Norte. A estaca de carvalho representa o Deus, e está colocada perto do Leste. A estaca de espinheiro é o Guardião que guarda o Portal do Círculo. Esse trilithon de estacas marca os limites do Portal do Círculo. Por que a Nordeste? Porque existe uma corrente de energia da Deusa, magnética, que percorre o planeta de Norte a Sul, e uma corrente de energia do Deus, elétrica, que percorre o planeta de Leste a Oeste. Por isso, colocamos o Portal no meio, a Nordeste.

Entremos no círculo. Num canto, ao Norte, está o altar. Ele chega até a cintura, para que a pessoa não tenha de se curvar ao oficiar. Sobre esse altar, temos um crânio (que pode ser de gesso), representando The Great Unmanifest/ The Source of All Things que, nesse universo, se manifesta como a Deusa e o Deus (qualquer dúvida, consulte Grimassi, "Witchcraft, a Mystery Tradition"). Sobre esse crânio, que tb é símbolo do Outro Mundo, temos uma vela, que, dependendo da época do ano, será vermelha ou preta. Mais pra nossa direção, temos uma estátua da Deusa (tendo ao lado uma vela vermelha), e uma estátua do Deus (tendo ao lado uma vela preta). Entre os dois e mais pra nossa direção, temos um caldeirão-incensário, que representa o útero da Deusa. O simbolismo é o seguinte: nossa alma vem do Outro Mundo (o crânio), através da união sexual da Deusa e do Deus, e chega aqui pelo útero da Deusa.
Sobre o altar, tb estão os Nove Instrumentos Mágicos da Bruxaria, cuja origem é o culto de Mitra. Uma influência de quando os soldados romanos, que eram quase todos devotos de Mitra, chegaram às Ilhas Britânicas.

No altar, tb está uma caixa de cedro, para os Colares do Renascimento, usados pelas mulheres. Cornalina para uma bruxa de primeiro grau, cornalina e âmbar para uma bruxa do segundo grau, âmbar para uma bruxa do terceiro grau, âmbar e azeviche para a Magistra do coven e azeviche para a Witch Queen. Esses colares podiam ter 40 ou 70 contas. O colar representava o Círculo do Renascimento. O Colar do Renascimento é um colar dado pelo deus à Deusa no Samhain, quando eles se apaixonam pela segunda vez (a primeira foi em Beltane) e trocam seus mistérios. Ele dá à Deusa o Colar do Renascimento e ela ensina a ele o mistério do Caldeirão do Renascimento. 

Marcado nesse altar, temos o símbolo de um XIII estilizado, o Símbolo da Bruxa.
De costas apoiadas no altar, se sentaria o Bardo, tocando o Tabor (que é o nome Wiccan do tambor), quando fosse apropriado.

Agora vejamos o centro do círculo. Às vezes podia-se colocar um caldeirão, ou, em Beltane, um Maypole feito de bétula. Na maioria das vezes, no centro do círculo estaria uma estaca bifurcada (a maneira de confeccioná-las pode ser encontrada em "Scottish Witchcraft"). As funções dessa estaca eram levar para cima a energia da Terra e direcionar o Cone do Poder.
Caso alguém fizesse algo muito errado no coven, e depois de passar por um Julgamento pela Espada (citado em "Feitiçaria, a Tradição Renovada") fosse considerado culpado e a Magistra decidisse expulsá-lo do coven, esse alguém seria amaldiçoado formalmente, e para isso se dançaria widdershins em torno de uma estaca de abrunheiro, que levaria para o "lado negro da Força" qualquer energia direcionada à estaca.

Agora olhemos para o chão. O círculo mágico pode ter o chão limpo, ou poderiam ter sido feitos nele desenhos com farinha. Esses desenhos podem ser encontrados em "Scottish Witchcraft". Um outro desenho que poderia ser usado era o símbolo da Roda do Ano. Se você olhar no "Book of Signs" de Rudolph Koch, vai ver um símbolo de significado desconhecido, "from an old french calendar". Aquela é a Roda do Ano.

Também poderia ser usado o símbolo do coven, desenhado no chão com farinha. Se uma mulher estivesse no período de "sangue da Lua" (ou "claret vermelho das Fadas", que é outro nome pra isso), usaria um colar de coral vermelho em honra à Senhora do Oceano de Sangue. Isso porque quatro são as pedras sagradas da Bruxaria: cornalina, âmbar, azeviche ("âmbar das Bruxas") e coral vermelho. Essas quatro pedras estão associadas às cores das quatro direções. Antes de serem usadas as cores vermelha, amarela, azul e verde, usavam-se as cores vermelha, branca, cinza e preta, associadas às cores do céu (se quiser saber mais sobre isso, procure no verbete "As quatro Airts" da Enciclopédia de Bruxaria de Doreen Valiente). O uso dessas cores para as direções, assim como o Drawing Down the Moon, tiveram sua origem em Creta.

Quando as pessoas chegarem a este círculo, talvez o Magister esteja usando uma indumentária especial, composta de uma galhada de cervo, colar, avental frente-e-verso de pele de cervo e botas (as botas são influência dos Mistérios Dionisíacos). Ou se vestirá de preto, assim como a Magistra. Os Quadrantes se vestirão de preto, cinza, branco e vermelho. O Mensageiro/Homem de Preto se vestirá de preto, e o Far Darrig/Homem Vermelho estará vestido de vermelho. Os restantes estarão de branco. A Witch Queen e o Magus, se estiverem presentes, estarão de branco, e deverão ser colocados tronos para que eles estejam sentados quando as pessoas beijarem suas mãos. O Conselho dos Elders tem o poder de eleger uma Magistra ou destituí-la antes do fim do mandato de 7 anos (novato não vota). A Magistra está submetida a um código de leis, pode eleger o próprio Magister e toma todas as decisões sozinha. No entanto, um condenado no Julgamento pela Espada poderia apelar para a Witch Queen e, se esta o absolvesse, a Magistra deveria acatar a decisão da Witch Queen.

Os açoites de seda serviam para purificar a aura e para induzir ao transe por meio do tédio. Não era pra causar dor, era pra ser bem suave e causar tédio. Em seu cabo estaria gravado o símbolo do açoite, que é um "cifrão" com uma, duas ou três barras, e esse seria o símbolo a ser gravado no túmulo da Bruxa após sua morte. Depois da purificação, todos adequadamente vestidos ou adequadamente nus (Gardner criou o termo skyclad para a nudez ritual, mas a nudez ritual já existia entre as Bruxas antes dele), se o clima estivesse propício, e todos com as insígnias dos cargos que ocupassem, os homens com jóias apenas de ouro ou cobre (se fosse reunido um círculo só com homens, todos deveriam usar exclusivamente prata, para dar uma equilibrada na energia) e as mulheres com jóias apenas de prata ou cobre (além dos colares de pedra), se posicionariam no círculo alternando homens e mulheres. (Os procedimentos de formação do círculo e saudação à Magistra foram omitidos nessa descrição). Caso fosse feita uma Dança Espiral, ela seria conduzida por um homem, que deveria mancar enquanto fizesse isso, representando o Deus Aleijado. Depois do Sabá, teríamos Bolos e Vinhos, com um obrigatório churrasco de carneiro e, na mesa do banquete, não haveria saleiro. Isso porque o saleiro era indicativo de hierarquia social, e sua ausência mostrava que as diferenças sociais do mundo exterior não se aplicavam ali.



Imagine ainda que esse coven tivesse um ritual para transformar um crânio em receptáculo de espíritos e interrogá-los. Um ritual desse tipo pode ser encontrado em "Feitiçaria, a Tradição Renovada", de Evan John Jones e Doreen Valiente. (Só tome cuidado, porque raramente um espírito diz alguma coisa que preste; provavelmente, o espírito vai querer zoar com a sua cara. É algo perigoso de se fazer.) Imagine também que esse coven usasse sexo ritual (no maior respeito). Para aqueles que apenas desejam turbinar a vida sexual, recomendo deixar de lado a Magia Sexual e ir direto ao Kama Sutra. Magia Sexual é um troço meio chato.

A cor de luto das Bruxas é o branco.
Por fim, gostaria apenas de lembrar que o fato de UM coven medieval fazer tudo isso não significa que todos, necessariamente, fizessem a mesma coisa.

Fonte: Nadia Betolazzi em Abrawicca